quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Sem Ti (R) - capítulo I

- Não compreendo essa tua obsessão por Rachmaninoff.
- Não esperava que compreendesses, aliás, duvido que compreendas seja o que for que esteja ligado ao Romantismo.
- O que queres dizer com isso?
- Nada...

Afastei-me, reparando no olhar misto de tristeza e incompreensão que me deitava.
A Joana era assim, eu não tinha o direito de a criticar. Há mulheres românticas e há mulheres que deitam os ramos de flores para o lixo. Ela era uma das últimas.
Saí porta fora, sem destino nem rumo. Queria simplesmente ser beijado no rosto por aquele vento de Inverno, de Janeiro, que tão bem sabe.
Sempre adorei o frio. Faz-me ser eu.
As ruas estavam desertas, à excepção dos cães vadios que buscavam a sua sorte com uma cadela cujo aspecto já tinha tido melhores dias. Os cães não são esquisitos, vão com qualquer uma, fazendo lembrar certos homens. No fundo, seremos assim tão diferentes? O que nos distingue dos animais é a cultura, a capacidade de nos regermos por valores, direitos e deveres e, perdido na divagação, entro no café do costume.
- Bom dia António!
- Boa tarde senhor João, boa tarde....
- Para mim só é tarde depois de almoçar
- Pois para mim é sempre tarde senhor João... e cada vez entardece mais.
- Hummm Joana?
- Que mais?...

Afasto-me para a mesa do canto. Hoje não me apetecem perguntas. Quero estar só. Fumar o meu cigarro, beber o meu café, mergulhar no meu desespero e decidir de uma vez por todas o que fazer.
Bebo o café de um trago, acendo o cigarro, puxo uma passa. Estou absorto em tudo o que vivi com ela. Todas as noites que passámos, a olhar a tecto, simplesmente a sentir que tudo estava certo. As madrugadas em que fizemos amor e as nossas respirações compassadas se uniam numa sinfonia intemporal...
Parece que foi há tanto tempo...
Envolvido, esboçando pequenos sorrisos, nem me dou conta do vulto que se aproxima de mim.
-Olá António! És mesmo tu?
Viro-me, sabendo já quem era. Aquela voz... até no fim mundo a reconheceria... senti-me gelar ao balbuciar:
- Olá....

1 comentário:

Ana disse...

Uai, estou a gostar, sim senhora.

Bem, ainda no outro dia estava uma cadela com o cio no meu prédio. Vou a entrar pela porta do mesmo, tentando bloqueá-la -porque, amigo, estavam carradas de cães a tentar entrar à força- mas fui atacada à traição e o sacanita de um dos bichos passou-me por baixo das pernas e tau fugiu escadas acima...